Uma noite com Sabrina Love

Como ainda não tinha começado o Show de Sabrina Love, Daniel percorria os sessenta canais da tevê a cabo roubada, deixando as imagens durarem apenas alguns segundos. Um locutor, o fundo do mar, umas girafas, um carro perseguindo outro, mulheres venezuelanas falando, lava vulcânica, as estradas na madrugada da Espanha, um homem com cara de terror, mãos decorando um bolo. Passamos ent. Você nunca poderá. Most incredible and amaz. Tástrofe dos úl. Allóra il vècchio. Um corte super. A planície do. Pare, Laurita.
Uma só história a toda velocidade, na qual o sol do mapa meteorológico via satélite brilhava sobre um documentário do Quênia, onde copulavam leões mostrando os dentes na mesma posição que o casal americano do canal pornô, que também mostrava os dentes e fechava os olhos como se quisesse esquecer da imagem do noticiário em que aqueles iraquianos apontavam metralhadoras para o goleiro argentino que caía de joelhos e levantava os braços porque sabia que iam fuzilá-lo e então via toda sua vida em um só clarão, começando pelos desenhos animados da infância. Uma história infinita que Daniel acelerava como se tentasse apressar o tempo que faltava para o programa de Sabrina Love. Só parava no beijo de algum casal que começava a tirar a roupa na penumbra azulada de um filme B, rogando que fosse longa a tomada do fogo na lareira fundida com a fachada de um edifício em pleno dia seguinte, quando a atriz faria um grande esforço para manter o lençol na altura das clavículas.